quinta-feira, janeiro 29, 2009
















Gran Torino (2008) é um acontecimento. Não importa muito se Clint ainda vai fazer mais filmes ou não: este é o seu último trabalho, o seu Liberty Valance. O filme dá seqüência àquele processo de reparação de que eu reclamava no texto sobre A Troca, ali embaixo – mas tem todo o jeito de final de raciocínio. Seu personagem é um veterano da Guerra da Coréia que vive em um bairro que virou gueto de imigrantes orientais. É de novo aquele sujeito que sabe o que é certo e o que é errado, que se dá o direito de ser o árbitro da justiça. Mas seu Walt Kowalski é um personagem que não existe há muito tempo (nesses termos) no cinema americano: é explicitamente preconceituoso, truculento, reacionário. As ofensas que ele diz – quase sempre com uma arma na mão – aos orientais e negros que moram em seu bairro e ao padre católico que quer ajudá-lo são inacreditáveis (e divertidíssimas).

Kowalski é obrigado a conviver, por uma série de circunstâncias, com a família de imigrantes do Laos que mora na casa ao lado e chega um momento em que ele tem – como na Coréia – de enfrentar novamente o ‘mal’ (porque, afinal, o ‘mal’ é sempre um ponto). A questão é como esse personagem que já sujou tanto as mãos de sangue lida com o problema. O que acontece é uma evolução natural de tudo o que Clint já refletiu sobre justiça, culpa, reparação e sacrifício em filmes como Os Imperdoáveis, Dívida de Sangue e Sobre Meninos e Lobos.

Como Dívida de Sangue, aliás, esse é um Clint vulgar – no sentido de que é ordinário: seus atores são desconhecidos (os que interpretam os vizinhos são tenebrosos), sua mise-en-scène é objetiva. Seria um filme banal se tivesse outro diretor. (Pode ainda assim ser banal. Assisti ao filme na noite anterior à sessão de imprensa da versão Imax de O Cavaleiro das Trevas – e confrontar esses dois filmes é algo que alguém precisa fazer.) No contexto da obra de Clint, porém, tem jeito de filme-marco.

(E espere para ouvir a música do final antes de discordar.)