domingo, fevereiro 03, 2008
















Parte da crítica parece ter assistido a Onde os Fracos Não Têm Vez (No Country For Old Men, 2007) como se fosse um filme do Clint Eastwood. De fato, o diretor de Os Imperdoáveis até poderia ver com certa nostalgia a decadência dos valores morais representados pelo personagem de Tommy Lee Jones. Mas os Coen nunca foram tradicionalistas nem em sua apropriação de gêneros – e tampouco economizaram sarcasmo para falar desta moral. Não é agora que eles viraram conservadores. Segue o texto do Guia (O Estado de S.Paulo) de 01/02.

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Venha, Javier

O novo filme dos irmãos Coen começa com uma maleta de dinheiro perdida no deserto, entre corpos que não sabemos de quem são – como se pudesse, assim, sem cerimônias, abraçar de uma só vez o universo do western (aquele dos desertos) e o do filme noir (aquele das maletas). Mas este é um filme dos autores de Fargo e O Homem Que Não Estava Lá – e, sabemos, eles não são de cerimônias.

Em Onde os Fracos Não Têm Vez, há um caçador oportunista (Josh Brolin), um psicopata que mata tudo o que se mexe (Javier Bardem) e um negociador pretensioso (Woody Harrelson), que vão disputar a tal maleta e, assim, prender a sua atenção por quase duas horas. Mas se eu fosse você não deixaria de prestar atenção em um delegado veterano (Tommy Lee Jones), que aparece aqui e ali ao longo da narrativa. Não é a primeira vez que você o vê, é verdade. Este xerife de intuição bem-calibrada aparece nos filmes americanos desde que eles existem. Na maioria deles, ele sabe bem como lidar com tipos como o trio da maleta. Neste filme, porém, ele está em descompasso. (O universo deste velho herói também está: repare em cada frentista e gerente de hotel que aparecerem na tela; eles são tão importantes para o filme quanto os astros que estarão no Oscar.)

Os efeitos que os Coen tiram destes descompassos não cabem neste texto e têm de ser experimentados sozinhos, mas falam sobre violência tanto quanto sobre cinema ou sobre a América. É a favor desta narrativa cheia de possibilidades (baseada no livro de Cormac McCarthy) que trabalham todas as idiossincrasias dos dois diretores. Se o filme ganhar mesmo o Oscar, os americanos premiarão seu melhor cinema.

4 Comments:

Blogger Guga Pitanga said...

Este está nas pendências para os próximos dias. Esta semana vi "Juno" e sobre ele escrevi.

http://lenfantdeboheme.blogspot.com/

8:33 AM  
Blogger Nikola Matevski said...

O PTA também... é filmar deserto que muito crítico já começa a citar John Ford. Lembrei de vários filmes vendo PTA, mas nenhum western, curiosamente.

8:48 PM  
Blogger paralaxe said...

é verdade. fiquei curioso para saber de quais filmes vc lembrou.

12:12 AM  
Blogger Nikola Matevski said...

por exemplo, o fato de sangue negro guardar certa distância do personagem principal, o fato de ele não ser propriamente um herói, mas um “personagem condutor” de que não conseguimos gostar nem odiar direito, me lembra os personagens kubrickianos. a riqueza inclusive, retratada naquele decadentismo e isolação da mansão, assim como a relação com o filho (talvez o único laço humano amoroso) me remeteu a barry lyndon e seu castelo, as contas pra pagar, a decadência. mas a visão entre pta e kubrick é bastante diferente e você tem toda razão quando menciona o cinema americano dos anos 70.

aliás, várias novidades em http://otpisani.blogspot.com pouco a ver com cinema, mas...

5:44 PM  

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