quarta-feira, maio 10, 2006
















"Com freqüência comparo um filme a um navio pirata. É impossível saber onde o navio vai chegar quando o deixamos livre para seguir os ventos da criatividade. Sobretudo com alguém como eu, que gosta de soprar em direções contraditórias. Houve um momento, aliás, em que eu considerava que a contradição era a base de tudo, que ela era o motor de cada filme."

Bernardo Bertolucci, em entrevista a Laurent Tirard

Comentar A Chinesa (La Chinoise, 1967) em 2006, tendo nascido em 1979, me parece quase tão absurdo quanto me arriscar a fazer uma resenha sobre a estréia do Brasil na Copa do Mundo. Então vou fingir que o texto é sobre Os Sonhadores (The Dreamers, 2003) – até é – que assim evito problemas.

Na verdade, é simples: o filme do Godard reforçou a minha idéia de que o filme do Bertolucci é menos sobre os anos 60 e mais sobre o século XXI. A maneira como os jovens do filmes do italiano se relacionam com cinema, política e sexo me parece bem diferente de como fazem os do filme do francês: como o pôster na parede da Marlene Dietrich (ou do Mao Tse-Tung), tudo pra eles só vale como imagem. Os referentes já ficaram muitos andares abaixo – e têm que entrar à força pela janela.

Bertolucci os reprime, mas os adora: que ele use os inserts dos filmes da mesma forma que seus personagens os entendem (e que a gente ache isso irresistível) deve ser uma dessas contradições de que ele está falando aí em cima – e que fazem o filme ser tão interessante.

Mais interessante por de ter sido feito pelo diretor de Antes da Revolução, um filme que, como A Chinesa, parece, daqui de longe, ser ao mesmo tempo pré-68 (pelo que antecipa daquele momento) e pós-68 (pelo sentimento meio premonitório de que os tempos já eram outros).