quinta-feira, abril 13, 2006















O facínora era o outro

O que faz de Dívida de Sangue (Blood Work, 2002) um filme interessante é o quanto remete à história do cinema americano (e à de seu diretor) e aponta para Sobre Meninos e Lobos, filme seguinte de Clint Eastwood.

O detetive aposentado encarnado por Clint, que volta à ativa pra fazer justiça por conta própria, conversa com o passado: é como se o John Wayne de O Homem que Matou o Facínora, em vez de ter morrido, tivesse se recolhido em uma casa de repouso e virado um velhinho transplantado, enfim chamado a retornar.

Ford lamentava, em 62, que esse homem tão caro ao cinema americano – capaz de discernir o bem do mal e, assim, decidir sozinho o que é certo e errado – já não tivesse mais lugar em um mundo “complicado” demais. Coisas de um velhinho conservador.

Clint, velhinho conservador de outros tempos, parece reanimar esse herói mítico pra revelar, talvez pela primeira vez em sua carreira, o que ele tem, além de ambíguo, também de inviável. Com a autoridade – e talvez um tanto de culpa – de quem também já o encarnou várias vezes.

É o que demonstraria, de forma mais explícita, mas também mais profunda, no seu filme seguinte – em que o sujeito passa de inviável a equivocado. (Lá está Sean Penn, o “rei que fez o que devia ser feito”, diante do qual o a lei se curva, aplaudindo a parada de Ação de Graças com clima de funeral.)

O curioso é que o seus filmes imediatamente anteriores, Cowboys do Espaço e Crime Verdadeiro (em que o seu personagem diáloga, aliás, com o Wayne de Rastros de Ódio), iam pelo caminho exatamente oposto.